A popularização da cirurgia plástica no Brasil ocorreu de maneira gradativa nas últimas décadas, mas ganhou status de fenômeno há pouco tempo. Tamanha demanda alçou o País à segunda colocação no pódio ocidental em quantidade de operações, superado apenas pelos Estados Unidos, e em terceiro lugar a nível mundial, ficando a China atrás dos americanos. São cerca de 630 mil procedimentos anuais, entre estéticos e reparadores, conforme pesquisa do instituto Datafolha realizada para a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP).
O impulso é explicado por um conjunto de fatores que convergiram para se chegar a esta grandeza: aumento do poder aquisitivo do brasileiro, avanços na pesquisa científica, aprimoramento de técnicas e equipamentos, alta qualidade da cirurgia plástica nacional, maior atenção à segurança do paciente, qualificação de centenas de novos profissionais anualmente, concorrência e, talvez o mais controvertido, acesso à informação.
Basta acordar pela manhã e as pessoas já estão expostas a uma quantidade infinita de mensagens que a mídia oferece por meio de todos os veículos de comunicação. Esta facilidade bem-vinda e necessária tem viés perigoso à medida que dela se faz mau uso – como tudo o que existe. E quando se trata de riscos para a vida humana, há de se fiscalizar com veemência e alertar de forma contínua.
Neste contexto, a cirurgia plástica tornou-se assunto trivial entre o grande público, mas existe muita confusão em torno do que é verdade na área. A oferta de promessas, técnicas milagrosas, máquinas precisas, tratamentos vanguardistas e previsões de resultado surgem de todos os cantos, a maioria propalada por médicos despreparados ou falsos médicos. Cabe às instituições e entidades de classe zelar por suas atividades e orientar a população. A indicação é sempre a mesma: certificar que o profissional é membro da SBCP, ouvir a opinião de dois ou mais especialistas e conversar detalhadamente com o médico de sua confiança até não haver mais dúvidas.
Com base em perguntas frequentes que chegam aos consultórios e de informações publicadas diariamente na imprensa, o cirurgião plástico Zulmar Accioli, membro titular da SBCP e diretor tesoureiro da regional catarinense, listou 30 questões bastante comuns entre os leigos e que geram muitas incertezas. Professor de cirurgia nos cursos de graduação e pós-graduação em medicina da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o médico esclarece o que é mito e o que é verdade:
01-A vibrolipoaspiração (com cânula vibratória) é mais segura que a cirurgia tradicional.
MITO Toda lipo apresenta os mesmos riscos. A vibrolipo tem a vantagem de ser menos cansativa para o cirurgião e a desvantagem de ser menos precisa que a técnica com seringa – a única em que se pode enxertar a gordura retirada em outras partes do corpo.
02-A lipoaspiração a laser proporciona cirurgia e pós-operatório mais rápidos.
MITO O único papel do laser é ajudar na perfuração da gordura e facilitar o trabalho do cirurgião. Tem, portanto, as mesmas vantagens e desvantagens da vibrolipo, sendo a consequência principal a destruição da gordura, o que impede a sua enxertia em outros lugares. Importante frisar que todas as técnicas de lipoaspiração se equivalem. O que realmente muda é o cirurgião. E não existe cirurgia que não incha e não deixa roxo. Isso vai variar a cada paciente.
03-Cânulas descartáveis para lipoaspiração eliminam totalmente o risco de infecções.
MITO Tanto as cânulas descartáveis quanto as esterilizadas têm o mesmo índice de segurança, desde que ambas tenham passado por um processo de esterilização e acondicionamento adequados.
04-É possível reconstruir o seio após a sua retirada por motivo de acidente ou doença, como o câncer.
VERDADE Sem dúvida. Existem várias técnicas e táticas cirúrgicas para diminuir a mutilação da retirada do tumor. Tudo irá depender da sequela do tratamento da doença, do desejo do paciente e das condições locais para reconstrução.
05-É preciso emagrecer antes de modificar o contorno corporal com cirurgia plástica.
MITO Em regra, não. O peso ideal para se fazer este tipo de operação é aquele que o paciente vai manter com facilidade. A cirurgia plástica não emagrece, apenas melhora o contorno corporal. O corpo a ser melhorado é aquele que o paciente efetivamente tem e não aquele que ele gostaria de ter. Emagrecer, submeter-se a uma cirurgia e depois engordar novamente resulta na perda de toda a melhora conquistada.
06-Pode-se engrossar as pernas com silicone.
VERDADE Sim, tanto as coxas quanto as panturrilhas. São cirurgias relativamente simples e os implantes são do mesmo material das próteses de mama.
07-Cirurgia plástica retira cicatrizes resultantes de acidentes ou de outras operações.
MITO No máximo, troca-se uma cicatriz feia por outra mais discreta. A eliminação completa de uma cicatriz é impossível.
08-O uso de polimetilmetacrilato (PMMA), substância derivada do petróleo, é perigoso para preencher grandes áreas, como seios e bumbum.
VERDADE Os preenchimentos artificiais só podem ser usados em pequenas quantidades. Isso é conhecido e aceito como uma verdade no meio científico. O desrespeito a esta regra pode causar complicações gravíssimas. Para grandes aumentos, como na região glútea, usa-se a própria gordura do paciente ou ainda o implante de silicone.
09-Cirurgia plástica com células-tronco é mais eficaz e proporciona resultados superiores.
MITO Não há nenhum benefício comprovado no uso de células-tronco em cirurgia plástica e os pacientes devem estar atentos às informações com puro objetivo de marketing. Vale lembrar que as técnicas comprovadamente eficazes são utilizadas por todos os cirurgiões plásticos. O que muda é como cada cirurgião vai aplicá-las.
10-O resultado da cirurgia pode ser retocado ou refinado e até totalmente refeito.
VERDADE Sempre que for possível melhorar o resultado de uma cirurgia, isto é feito. Na maioria dos casos, é o próprio cirurgião que propõe a intervenção. Mas é preciso reforçar que, algumas vezes, o paciente gostaria que o resultado da cirurgia fosse ainda melhor e isso já não é mais possível. A cirurgia tem limites e eles dependem muito de como é a estrutura do paciente. Aperfeiçoa-se apenas o que é aperfeiçoável, infelizmente.
11-O paciente pode fazer quantas operações quiser em uma mesma sessão cirúrgica.
MITO Não. A principal diretriz em cirurgia plástica estética é a segurança. A maioria dos cirurgiões adota como limites duas cirurgias médias (mamas e abdômen, por exemplo) ou um máximo de seis horas de procedimento cirúrgico.
12-Crianças podem ser submetidas à operação plástica.
VERDADE A cirurgia plástica reparadora não elege idade mínima. Quanto à de cunho estético, apenas a correção de orelha de abano se faz na infância, após os seis anos de idade e no momento em que a criança se queixa aos pais.
13-Cirurgia nas pálpebras compromete a visão.
MITO Em regra, não. Pode ocorrer sensação de areia nos olhos durante algumas semanas, mas tudo volta ao normal em até três meses.
14-É permitido implantar silicone nos seios de adolescentes.
VERDADE Do ponto de vista médico/cirúrgico, desde que a fase de crescimento da menina tenha acabado (normalmente, dois anos após a primeira menstruação). Mas, em regra, os cirurgiões preferem fazer a cirurgia após os 18 anos, quando a paciente está mais madura psicologicamente. Realiza-se a operação em pacientes menores de idade apenas se o crescimento já estacionou e se ambos os pais estão de acordo.
15-Cirurgia plástica dura para sempre.
MITO A operação melhora o aspecto da pessoa, mas, infelizmente, o tempo é inexorável e o envelhecimento continua indefinidamente. Quando o paciente tem uma pele favorável, espera-se que o resultado de uma cirurgia de face permaneça agradável entre seis a oito anos.
16-As chamadas orelha de repolho, comuns em praticantes de luta livre e jiu-jitsu, não têm conserto nem com cirurgia.
VERDADE O resultado da cirurgia de reconstrução é muito ruim, pois a cartilagem é completamente destruída. O melhor tratamento nestes casos é a prevenção.
17-A cirurgia da face (facelifting) torna o paciente mais bonito.
MITO Ela apenas dá um aspecto mais descansado ao rosto. Importante ressaltar que a operação é somente um passo do rejuvenescimento facial. É imprescindível o uso posterior de peelings, toxina botulínica, preenchimentos e uma boa maquiagem para alcançar o melhor resultado possível.
18-A região operada perde sensibilidade.
VERDADE Sempre que existe uma incisão cirúrgica, acontece alguma perda sensitiva. Na maioria das vezes, isto é transitório, raramente será definitivo.
19-Após modificar certas regiões do corpo, como nariz, olhos, boca ou seios, é possível voltar à forma antiga.
MITO A pessoa nunca mais será a mesma. Portanto, não é possível voltar ao status quo anterior. Mesmo que fosse, haverá uma a cicatriz que ficará lá para sempre.
20- Cirurgia plástica na barriga só se faz quando há sobra de pele na região, não é para emagrecer.
VERDADE Nenhuma cirurgia plástica serve para emagrecer. Apenas para melhorar o aspecto do corpo. Pode-se aspirar a gordura localizada e retirar o excesso de pele, o que melhorará o contorno corporal. Mas, o paciente continuará com um peso muito próximo ao anterior à operação.
21-A cicatriz da cirurgia da barriga é sempre grande e aparente.
MITO Será tão longa quanto o excesso de pele. É geométrico. O que o cirurgião plástico faz é colocar a cicatriz o mais baixo possível, para ficar escondida sob a calcinha, biquíni ou sunga.
22-A pele da região operada pode formar queloide, descolorir ou escurecer.
VERDADE A condição da pele depende de dois fatores. O primeiro é o técnico, e o cirurgião plástico é treinado para fazer a melhor cicatriz possível. O segundo, e mais poderoso, é o genético. Quanto a este ninguém tem ainda o poder de interferir, infelizmente.
23-Mulheres que acabaram de dar a luz podem fazer plástica.
MITO Como regra, aguarda-se cinco meses após o parto e mais três depois da interrupção da amamentação. Assim, na maioria das vezes, opera-se a paciente nove meses após o nascimento da criança.
24-Cirurgia plástica também se faz nos órgãos sexuais.
VERDADE É muito comum as mulheres solicitarem a diminuição dos pequenos lábios (ninfoplastia) e o aumento dos grandes lábios (com enxerto de gordura). Estes procedimentos dão um aspecto jovial à área que se modifica com a idade, principalmente após a gestação.
25-O resultado do transplante capilar parece com cabelo de boneca.
MITO Com a técnica de microtransplante, o resultado tende a ser bastante natural e os cirurgiões que se dedicam a este procedimento apresentam resultados muito naturais e duradouros.
26-Pode-se implantar cabelo de outra pessoa.
MITO Em regra geral, não. A exceção é somente quando o doador for gêmeo univitelino com o receptor: o chamado transplante isogênico.
27-Existe técnica específica para eliminar o chamado pescoço de peru.
VERDADE Quando são apenas as pregas musculares (bandas platismais), existe uma técnica em que se usam apenas agulhas, sem incisões nem pontos, dando um resultado bastante satisfatório. Mas, se já existe excesso de pele, o lifting cervical clássico é necessário.
28-Com um programa de computador, é possível simular o resultado da cirurgia.
VERDADE Sim, mas a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica condena esta prática, pois o paciente pode ser induzido a pensar que o resultado da operação sairá melhor do que poderá ser na realidade.
29-O pós-operatório é mais confortável no clima frio que nas temporadas de calor.
VERDADE Em muitas cirurgias, há necessidade do uso de malhas compressivas, o que no calor pode ser mais incômodo. No resto, não há diferença entre os períodos. A época boa de operar é aquela que for boa para o paciente, quando sua vida está organizada para se submeter a um procedimento cirúrgico.
30-Medicina estética é uma especialidade que capacita médicos de qualquer área a lidar com a beleza do corpo.
MITO Medicina estética não existe, enquanto especialidade médica. Os procedimentos chamados de estéticos são realizados por cirurgiões plásticos e por dermatologistas. Normalmente, os que se intitulam “especialistas em cirurgia estética” são os que não possuem nenhuma especialização reconhecida e trilham o caminho mais fácil: se passam por cirurgiões plásticos ou por dermatologistas sem terem capacitação para tal.
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